‘Ideológicos’ e liberais disputam espaço no governo

| BRASILAGRO


Segundo economista, dicotomia está presente em outras áreas, mas fica mais evidente na agricultura pela importância econômica.
O risco de perder mercado no exterior, por conta da imagem arranhada do Brasil, colocou em alerta agroindústrias e grandes produtores de grãos no País. Em meio à pandemia do coronavírus, investidores estrangeiros, sobretudo da Europa, ameaçam não comprar produtos brasileiros por conta do alto índice de desmatamento.

 

“De fato, tem se instalado no governo uma visão extremamente antiga, que o ministro (Ricardo) Salles representa, de um discurso mais agressivo, que agrada à ala mais radical do governo”, diz o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB Associados.

 

Duas agendas diferentes pautam atualmente o agronegócio, de acordo com especialistas ouvidos pelo Estadão. De um lado, uma ala mais “ideológica” e considerada radical, representada pelo ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente), e outra que prega conceitos mais liberais e é pragmática, integrada pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina. 

“Aí tem racha mesmo. Não é a única pasta (do governo) em que aparece essa dicotomia. Tem a educação e o comércio exterior. Mas a agricultura é o único segmento da economia que está crescendo. É um embate sério e que pode nos custar bastante”, diz Mendonça de Barros.

Para Mendonça de Barros, o tema de desburocratização do setor, que deu origem à fala da “boiada” do ministro Salles e gerou a mais recente polêmica no setor, merece atenção, mas não é o principal gargalo.

“O grosso dos agricultores está mais alinhado com a ministra e o que ela representa. Não precisa queimar um hectare de floresta para aumentar a produção agrícola e atender à demanda crescente aqui e lá fora. A questão da sustentabilidade virou um tema do mundo, não só da Europa”, diz.

Parte dos agricultores e da agroindústria ouvidas pelo Estadão, sob condição de anonimato, teme que a ministra da Agricultura perca força, por conta da pressão, para a ala mais radical do governo. 

O secretário especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Nabhan Garcia, vê exagero nessas preocupações e diz que o Brasil não pode entrar “nas maluquices de ONGs.” Garcia representa uma ala mais alinhada a Bolsonaro.

Moeda política
Para o presidente da Frente Parlamentar da Agricultura, deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS), não há agronegócio rachado. Segundo ele, em um setor do tamanho do agro brasileiro, que tem 47 instituições, não há unanimidade. “Tem muito ambientaloide querendo dar uma carga ideológica para este processo. Pode ter discordância em alguns temas, mas não racha.”

O agro brasileiro, segundo o parlamentar, tem de ser visto daqui para a frente como uma moeda política, assim como o petróleo é para a Arábia Saudita. “Ninguém consegue sentar para discutir segurança alimentar para as próximas duas décadas sem trazer o Brasil para a mesa. Isso incomoda muita gente.”

Tema caro ao agronegócio, a crise diplomática com a China, principal importador de produtos nacionais, será discutida entre parlamentares e representantes do Instituto Pensar Agro no próximo dia 30. “A China não vai deixar de comprar do Brasil por fuxicos laterais. Se tem de fazer uma crítica a posições de membros do governo à China, vai ser feita de maneira muito clara”, diz Moreira.

Procurados para comentar o assunto, os ministros da Agricultura, Tereza Cristina, e do Meio Ambiente, Ricardo Salles, não retornaram os pedidos de entrevista (O Estado de S.Paulo, 21/6/20)



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