[Os 50 anos da Copa de 70] A vitória para o lendário Mário Américo e a melhor definição do "Pelé-equipe"

| TRIVELA/LEANDRO STEIN


Um dia após as semifinais, o Brasil 3×1 Uruguai e o Itália 4×3 Alemanha Ocidental ainda repercutiam. A Seleção viajou à Cidade do México para se preparar à decisão no Azteca e os jogadores das duas equipes finalistas começavam a virar sua chavinha, para se voltar ao confronto derradeiro. Confira mais um episódio de nosso diário sobre o Mundial de 1970:

Um remanescente do Maracanazo ainda fazia parte da delegação brasileira na Copa de 1970: o massagista Mário Américo, uma das pessoas mais queridas pelo elenco. Ao Jornal dos Sports, confessava como a classificação sobre o Uruguai era importante a ele: “Que alívio! Foram 20 anos esperando isso. Vocês não podem imaginar o que representa para mim. Sabe que eu não consegui dormir na véspera do jogo? Era uma agonia, uma expectativa que nem sei explicar. Eu, mais do que todos, precisava da vitória. Questão de paz interior, vocês entendem? Como eu dormi bem esta noite, depois da classificação…”. Mário Américo tinha seu ‘confessionário’ – a sala no hotel onde a Seleção estava concentrada, em que tratava os jogadores e também dava conselhos, por toda a sua experiência de seis Copas do Mundo. Os atletas sabiam bem o que significava o triunfo ao ‘tio’, como era carinhosamente chamado.

“Tenho 12 anos de Pelé. Sou do tempo em que ele matava no peito e, antes de fulminar o goleiro sueco, ainda arranjava um lençol no beque mais próximo. Conheço o de mil tabelinhas: quando não havia Pagão, ele tabelava com Coutinho – quando não havia Coutinho, ele tabelava com Tostão – quando não havia ninguém, ele tabelava com as pernas do próprio adversário. Pelé dos gols de placa, dos dribles verticais, oblíquos, horizontais. Pelé das antevisões criadoras de espaços impressentidos. Pelé, ao mesmo tempo arco e flecha, acionando e alvejando”.

“Quantos gols de cabeça, Pelé? Pelé, milagre de equilíbrio a romper estaturas individuais e coletivas no terreno congestionado da grande área. Quanta coisa bonita inventaste pelos campos deste mundo, amigo Pelé: a paradinha, não sei por que proibida; o drible incisivo, aplicado com o pé em faca; a falsa hesitação que aterra o beque; o soco no ar, superlativo do próprio gol”.

“Cheguei ao Mundial de 70 espiritualmente preparado para aplaudir um novo Pelé-futebol-reflexão. Pelé de 30 anos, futebol de fita métrica. E, de fato, ele aí está maduro, precioso, calculista. Mas, como a face do líder não sacrifica o gênio do artista, ele aí está também, imaginoso como sempre, irresistível como nunca”.

“A bola da Copa não é branca, nem amarela, nem preta-e-branca, nem Adidas, a bola da Copa é aquele imenso lençol de Pelé contra o goleiro tcheco, na fase de grupos. A bola da Copa é aquele bate-pronto de Pelé, puro improviso que eu aplaudi, vendo o goleiro uruguaio fazer a mais aflita acrobacia para evitar o gol. A bola da Copa é o gesto sem bola de Pelé, aplicando em Mazurkiewicz maravilhoso corta-luz-clarão de inteligência que a memória dos meus olhos não esquecerá jamais”.

“Pelé, do repertório inesgotável, legenda de mil gols e, em cada gol, um gesto nas arquibancadas: lágrimas, risos, rezas, morte, talvez”.

“Mas, não sei: eu sempre senti Pelé o símbolo do futebol, nunca a encarnação de um time de futebol. Ele podia fazer sozinho a obra de um time inteiro, mas não sabia ser parcela do time. Entende, leitor? Ele é tão bola, tão futebol, que seu destino nunca foi jogado na mesma parada de sua equipe”.

“Por isso, muito prazer, Pelé-equipe: ‘Hoje’, dizia ele na manhã da estreia contra a Tchecoslováquia, ‘hoje, cada um de nós vai ter que correr por dois’. E desde então, Pelé tem vivido, com a firmeza de um líder, cada minuto sua Seleção. Ele inventa, como artista, um gesto sublime e, no instante seguinte, atira-se aos pés do rival para tomar-lhe a bola. Ele corre o campo inteiro, atento a tudo e a todos: aplaude a falha do colega, esbraveja na violência do adversário, concilia com o árbitro, dá a tônica da bravura e da humildade”.

“Vocês se lembram daquela que contei, depois do jogo com a Inglaterra: os fotógrafos estavam querendo arrumar a equipe para uma fotografia pretensiosa. Pelé, que estava lá em baixo trocando a camisa com Bobby Moore, veio correndo e expulsou o próprio time do campo: ‘Não é hora de fotografia, não. A Copa ainda não acabou'”.

“Não faz um drible a mais, nem um drible a menos: é a conta certa de quem joga com a disciplina de um soldado. Até nos clarões, Pelé está funcionando com absoluto realismo. Ele não retoca o chute, não requinta o drible, não enfeita o passe e nem recusa o combate. Dá-se integralmente ao destino da equipe, merecendo, por isso, o respeito profundo de todos os companheiros”.

“No gol de Cubilla, vi lá de cima alguns jogadores levarem à cabeça as mãos do desespero. Mas vi no mesmo instante Pelé acenando, gestos largos a recomendar calma: ‘Calma, pessoal, que nós vamos lá’. E foram mesmo. Não tendo em Pelé a salvação, mas tendo nele um precioso estímulo à salvação”.

“É porque Pelé deixou de ser o time para ser do time. É que ele chega à final de 70 como o mais decisivo líder de equipe neste Mundial. Pelé, cidadão do mundo, cidadão do Mundial”.

“Eu não sou o jogador mais velho, mas sou o mais veterano. Tinha uma vontade especial de disputar esta Copa até o fim e de ganhá-la, se possível, pois sei que será minha última. Por isso procurei contribuir para o time também, como um conselheiro, e não só como um simples jogador”, destacava o Rei, ao Jornal do Brasil.

O craque ainda comentou os planos de se aposentar após o Mundial, ao Jornal dos Sports: “Depois da Copa, largo tudo e cuido dos meus negócios e da minha família. Se Deus quiser, e se ganharmos a Copa, estarei totalmente realizado como jogador. Já recebi convites para dirigir equipes, mas prefiro ficar no Santos e orientar os juvenis e os infantis da Vila Belmiro”.

“E muita gente boa andou dizendo que o Brasil jogaria na retranca e que seria impossível fazer gols com um homem apenas na frente. Já fizemos 15 gols e perdemos pelo menos uma dúzia que poderiam ser marcados com um pouco mais de sorte. Dá uma média de três gols por jogo. E agora, o que vão dizer os que me acusam de ser apologista da retranca?”, disse o treinador, em entrevista ao Jornal dos Sports.

“Ainda é cedo para pensar em levantar a Jules Rimet, a exemplo do que fizeram Bellini e Mauro naquelas duas memoráveis campanhas. Agora, estou pensando em dar tudo e, se for preciso, cair morto em campo para garantir a vitória ou correr para alcançar, seja como for. O jogo de domingo é que não podemos nem pensar em empatar. Precisamos vencer e podem estar certos de que nos mataremos em campo para cumprir nossa missão”, disse Carlos Alberto Torres, ao Jornal dos Sports.

Ao Jornal do Brasil, também destacou a força dos discursos de Zagallo ao elenco: “Zagallo deu a maior bronca em todo mundo no intervalo contra o Uruguai, mexendo muito com os brios do pessoal. Na véspera, Zagallo já não tinha escondido sua emoção. Ele falava com um entusiasmo fora do comum. Dizia que nós não podíamos nos entregar no final. Eu até pedia a palavra, aparteando-o, para que ele não chegasse às lágrimas”.

“No começo era difícil jogar na minha nova posição. Agora já me adaptei e sei que tenho que ser o pivô do ataque, jogando de costas para o gol e dando jogadas para os outros. Tive que mudar porque senão, com todas as críticas que se levantavam lá no Brasil, eu acabaria de fora. O Saldanha acreditava que eu poderia jogar assim e me fez titular. O Zagallo também acabou por se convencer. Eu tenho que jogar na frente do Pelé, dando-lhe um apoio para tocar a bola e recebê-la mais adiante. Nosso entendimento agora já é quase perfeito”, explicava Tostão, ao Jornal do Brasil.

“Sei que o Pelé, quando recebe a bola, muitas vezes dá um passe para a frente sem ao menos olhar. Depois destes meses todos, eu já sei aonde devo estar para receber e dar prosseguimento. Meu papel realmente é de ser um ponto de referência, porque, com um beque colado às minhas costas, quase nunca tenho condições de manobrar. Eu procuro abrir brechas para a penetração de outros jogadores, como Jairzinho, ou então tocar de primeira, porque aí então o homem que mandam grudar comigo já fica batido”, finalizava.

“Não fiquei apavorado pelo número de jogadores no setor, mas porque eles só jogavam nos marcando e jamais armando sua equipe. A preocupação deles com a defesa foi exagerada e, depois que marcaram o gol, fiquei preocupado com o que poderia acontecer. Graças a Deus encontramos uma fórmula no segundo tempo para melhorar bastante a produção da equipe. O jogo estava sendo feito muito pelo lado direito e pedi a Zagallo para me dar liberdade para que eu pudesse ir para aquele lado e ajudar o Jairzinho. O técnico consentiu”, analisou Rivellino, ao Jornal do Brasil.

“Eu sei que me criticavam muito porque eu não chutava a gol. Acontece, porém, que eu jogava mais recuado do que os outros dois armadores e não podia mesmo arriscar com chutes a esmo, sem certeza. E principalmente tendo tão bons chutadores na frente, sempre mais adiantados e melhor colocados. Na partida contra o Uruguai, entretanto, eu é que fui o armador e Gérson, o distribuidor. Acho que provei também as minhas qualidades ofensivas”, comentou o meio-campista, ao Jornal do Brasil.

“Estou gostando de jogar como zagueiro e até penso diferente em relação à minha volta ao Cruzeiro. Deixo esse problema para meu técnico resolver, já que ele está aqui assistindo à Copa do Mundo. Na Seleção, Zagallo chegou à conclusão de que tínhamos que fixar Brito como líbero, já que eu só posso ficar nessa posição em último caso, pois estou mais acostumado combatendo diretamente o adversário. Como eu não sei cabecear por falta de costume, Zagallo, Brito e eu traçamos um plano de jogo em que Brito sempre sobraria para pular de cabeça, com os adversários”, contou Piazza, ao Jornal do Brasil. Volante no Cruzeiro, o defensor crescia no Mundial atuando como quarto zagueiro, após um início sob desconfianças.

“Nosso time está muito bem preparado e temos condições para jogar dentro do mesmo nível físico com que disputamos os cinco jogos vencidos até agora. Quem quiser fazer uma análise, vai concluir que o time brasileiro sempre cresceu no segundo tempo, o que prova o seu bom preparo. Depois do período de treinos em Guanajuato, de maior altitude, não acho que haverá problema com isso na Cidade do México. Podíamos chegar na véspera do jogo, mas acho que é importante chegar antes e realizar dois treinos no campo onde se disputará a final”, comentou Lídio Toledo, médico do Brasil, ao Jornal dos Sports.

“A vitória bastou para que muitos como eu, que sofreram e ainda sofrem na carne aquela humilhação de 50, estejamos hoje de alma lavada. Obrigado, meus jovens e valentes jogadores de 70. Vocês devolveram a eles, depois de 20 anos, e com juro, a derrota amarga que sofremos. Mas ainda temos outra derrota amarga. Mais velha ainda. Foi a que nos impôs a Itália na Copa de 38. Primeiro, fora do campo, com aquela história de que o Niginho – por ser filho de italiano – não poderia jogar contra a Itália. Depois, dentro do campo, com um pênalti marcado contra o Domingos da Guia, quando a bola estava fora de jogo. Domingo será a grande oportunidade de vingarmos também essa derrota. Se isso acontecer – e tenho fé em Deus de que acontecerá – então poderemos levar a taça para casa. Melhores mãos que as brasileiras para carregarem não existem, hoje, no mundo”.

“Zagallo provou sua velha teoria de que, para um time ser ofensivo, não é necessário que seus atacantes joguem avançados permanentemente. O importante é que eles saibam avançar e consigam desmanchar o bloqueio adversário, explorando os espaços que criaram. Não há nessa Copa do Mundo time mais objetivo que o brasileiro, e os que acusavam Zagallo de defensivista, têm de reformular honestamente suas opiniões, pois não há também time mais ofensivo. Na realidade, estamos utilizando permanentemente seis atacantes. São os cinco homens tidos como tal e mais Clodoaldo”.

“Aqui está um capítulo à parte. Dentro da concepção de jogo da seleção brasileira, Clodoaldo ganhou uma dimensão que não tinha nem no próprio Santos. De repente, Clodoaldo se revela um homem ofensivo, capaz de buscar a área para penetrações surpreendentes ou de atirar perigosamente de fora da área. A nossa defesa é débil? Talvez, talvez. Mas estamos agora surpreendidos com a inversão total do que esperávamos do time brasileiro. Se não o conhecesse bem, jurava que Zagallo era autor da famosa frase: a melhor defesa é o ataque. Sobretudo quando esse ataque é melhor que qualquer defesa”.

“Um técnico só consegue impor convicção se os jogadores acreditam nele. É o que noto nas relações de Zagallo com esta Seleção, que ele formou em matéria e espírito. Há uma comunicação espontânea entre as duas partes, seja na transmissão de uma ordem, seja numa pelada de reservas. Vários jogadores já entraram e saíram do time sem que, em 48 dias de contato com a Seleção, tivesse eu ouvido o menor ressentimento. Todos confiam no que está sendo feito em benefício do grupo, onde a rivalidade tola não tem lugar. Com determinação e uma tranquilidade madura demais para quem, há cinco anos, se tornou técnico, Zagallo chegou aonde queria: dar crédito ao seu sistema de jogo, unidade de luta aos jogadores e, com esses dois elementos, recolocar o futebol brasileiro na posição de liderança que já divide com a Itália”.

O preparador físico Carlos Alberto Parreira e o observador Rogério (este, ponta do Botafogo, cortado às vésperas da estreia) estiveram no Itália 4×3 Alemanha Ocidental da semifinal. Ambos levaram importantes anotações a Zagallo, durante a preparação à decisão.

“Vários jogadores no final do tempo normal colocavam as mãos nos quadris, evidenciando um cansaço prematuro. É por isso que o time brasileiro deve forçar ao máximo o ritmo de jogo no segundo tempo, fazendo os italianos correrem, o que será difícil para eles. Os alemães mereciam vencer e isso deveria ter ocorrido não na prorrogação, mas no tempo normal. O que houve na prorrogação foi que talvez a Alemanha tivesse achado que a partida estava decidida e que pudesse ainda conquistar mais gols. Aí houve um descuido fatal na defesa, pois o time italiano nos contra-ataques é perfeito. Por isso é que o Brasil não pode largar a defesa: tem que jogar com uma atenção redobrada”, contou Parreira, ao Jornal do Brasil.

Rogério, por sua vez, salientava os destaques individuais: “Riva e Boninsegna ficam sós lá na frente, mas quando seu time tem a bola dominada eles se deslocam em grande velocidade para propiciar a entrada de Mazzola, Domenghini e De Sisti. Esta jogada é estudada e contra os alemães funcionou. Já no gol, Albertosi pode ser comparado até a Banks. Tem perfeita noção de saída e seu soco na bola é impressionante, pois a mesma vai parar quase no meio do campo”.

Escrevia o Jornal do Brasil: “Guadalajara despediu-se da seleção brasileira como se fossem seus filhos que partiam. O grande número de pessoas que compareceu, com suas bandeiras, estava triste e algumas chegaram a chorar. O tempo frio e escuro, além da chuva fina que caía, concorria para que o ambiente ficasse ainda mais triste. Os jogadores, em sua maioria, preferiram não sair da sala de visitantes ilustres, onde conversavam e escutavam as músicas tocadas por um conjunto de mariachis. Os poucos que saíram até o saguão foram cercados pelos caçadores de autógrafos e, principalmente, pelas garotas que lhes desejavam felicidades”.

Escrevia o jornal O Globo: “‘Brasil, Brasil, Brasil’, era a exclamação de milhares de pessoas presentes ao desembarque dos brasileiros no Aeroporto Internacional do México, por volta das 19 horas. A delegação viajou em avião especial, fazendo o percurso de Guadalajara até a capital em pouco mais de 45 minutos. Apesar da chuva, um público enorme foi receber a delegação brasileira, provocando tumulto e dificultando inclusive o desembarque dos jogadores, que quando apareciam na porta do avião recebiam vivas e aplausos. Sem dúvida, em que pese a simpatia de ser quase geral, Tostão, Pelé, Rivellino e Jairzinho eram os mais aplaudidos e seus nomes os mais exclamados”.

“O interessante do fato é que o público em sua maioria era constituído por mexicanos, numa prova evidente de que continuamos a merecer a simpatia do hospitaleiro povo asteca. Os torcedores brasileiros também compareceram, mas em menor número, já que grande parte ficou em Guadalajara, onde todos os transportes estão sendo utilizados para trazê-los até aqui. Os torcedores não conseguiram se conter quando a porta do avião abriu e houve invasão da pista, sem que houvesse preocupação da torcida com a chuva que caía. O ônibus da delegação foi até a porta do aparelho, única forma de desembarcar os jogadores. Novas dificuldades para a saída do veículo, mas finalmente ele conseguiu ganhar as avenidas que chegam ao aeroporto e foi diretamente à concentração, já então sem maiores problemas”.

“Somos uma equipe tranquila. Aceito as críticas da imprensa com relação às nossas atuações no início do Mundial, mas o problema é que jogávamos muito nervosos e tremíamos só em pensar na possibilidade de sermos desclassificados. Há 30 anos que não conseguíamos ultrapassar a fase de grupos e esse problema vinha perseguindo todas as seleções italianas. Na final, os dois times têm chances, mas devemos jogar um pouco mais fechados. Outras equipes têm um goleador ou no máximo dois. O Brasil é diferente. Tem um ataque onde estão um Jair, um Pelé, um Tostão, um Rivellino. São todos goleadores que, numa só jogada, podem acabar com a festa de qualquer adversário. Vamos saber se realmente a melhor defesa é o ataque”, disse Gianni Rivera, armador da Itália, ao Jornal do Brasil.

Capitão da Itália, Giacinto Facchetti ainda repercutia a vitória épica sobre a Alemanha Ocidental na semifinal: “Até o último segundo estivemos temendo que os alemães marcassem outro gol. Felizmente, nosso goleiro Albertosi, que cometeu alguns erros, nos salvou também de ocasiões bastante perigosas. Resistimos melhor que os alemães porque estávamos mais descansados ao começar a partida. Eles jogaram encontros mais difíceis que nós antes e gastaram todos os seus esforços no segundo tempo da prorrogação”.

“Foi o maior presente que recebi em toda minha vida profissional. Foi a melhor partida que vi em toda minha vida. A Italia mostrou a todo mundo que pode se superar e a Alemanha demonstrou ser um adversário ótimo, valorizando em muito o triunfo. Domenghini está com uma inflamação das vias respiratórias pelo esforço que despendeu em campo. Foi um grande lutador, mas sofreu as consequências de seu grande amor ao time italiano. Vamos esperar que se recupere para jogar contra o Brasil. Caso não jogue, tenho dúvidas quanto ao seu substituto”, avaliou Ferruccio Valcareggi, técnico da Itália, ao Jornal do Brasil.

“Os brasileiros têm ótimos jogadores. Alguns fora de série, como é o caso de Tostão e Pelé. Falam muito em Rivellino e Gérson, mas do pouco que vi pela televisão, Tostão e Pelé são os maiores, tecnicamente ou taticamente. Além disso, ambos estão jogando para a equipe, apesar de estrelas, o que demonstra que o Brasil conseguiu equilibrar-se psicologicamente e está jogando com humildade. O futebol sul-americano é virtuoso e preciso. O Brasil é perigoso pela improvisação que pode mudar toda uma partida em poucos minutos. A Itália está jogando um futebol mais objetivo, mais tático. Jogamos conforme nos pede o adversário”, complementava.

Médico da seleção italiana, Leonardo Vecchiet avaliava as condições físicas de seu time após os 120 minutos no Jogo do Século. Ao jornal O Globo: “Qualquer equipe do mundo, melhor preparada que estivesse, teria que sofrer alguma reação depois de uma partida como esta contra a Alemanha. Temos apenas que recomendar muito repouso e um treinamento só para movimentar. Pela manhã é o melhor horário, pois assim podem ainda repousar o resto do dia”.

Na véspera da final, surgiu um conveniente rumor ao Brasil: Gigi Riva teria testado positivo no exame antidoping depois da vitória sobre a Alemanha Ocidental, por uso de estimulantes. A Fifa, entretanto, negava as especulações e afirmava que os resultados dos exames sequer eram conhecidos, porque as amostras seguiam no laboratório. Se existisse alguma irregularidade, o Comitê de Disciplina avaliaria o procedimento.

“Depois de duas prorrogações, não se poderia exigir mais. Jogamos quatro partidas, em vez de duas. Eu só posso dar parabéns aos italianos, pelo grande espetáculo que demos na Cidade do México. Fomos realmente descuidados, pois não prendemos a bola como os italianos fizeram. Temos, é verdade, o argumento da contusão de Beckenbauer. E vamos reconhecer também que os italianos não nos deixaram segurar o jogo por muito tempo. Estarei presente na final. Vai ser um grande espetáculo. Depois desses dois jogos da Alemanha, realmente dramáticos, nada como uma final de Copa sem favoritos”, afirmou Helmut Schön, técnico da Alemanha Ocidental, ao Jornal dos Sports.

“Deveríamos ter obtido a vitória no tempo normal. Tivemos oportunidades para isso. Dominamos bem o segundo tempo, principalmente a partir dos 15 minutos, mas por pouco que não conseguimos o empate, forçando a prorrogação. Minha lesão influenciou um pouco o meu rendimento, mas, com sinceridade, não sei se estivesse bem a Alemanha venceria. Acredito até que não”, apontou o craque alemão-ocidental, ao Jornal do Brasil. O líbero estava descartado para a decisão do terceiro lugar, contra o Uruguai.

A Fifa já tinha definido o árbitro da decisão àquela altura: seria o alemão-oriental Rudi Glöckner. Em seu currículo, já tinha apitado os Jogos Olímpicos de 1964, inclusive uma partida do Brasil. Entretanto, não fazia parte dos medalhões do quadro de arbitragens da Fifa. Sua escolha atenderia a um pedido dos brasileiros, que preferiam algum juiz europeu menos badalado, para evitar aqueles que já conhecessem os jogadores italianos. Seria apenas a segunda partida apitada por Glöckner no torneio, após o Itália 0x0 Uruguai da fase de grupos. Elogiado pela atuação na finalíssima, sua carreira deslanchou depois. Chegou a comandar a final do Mundial Interclubes de 1970, a da Copa de Feiras de 1971, a Supercopa da Uefa de 1974 e a da Copa da Uefa de 1976. Também participou da Euro 1972 e da Copa do Mundo de 1974. Ainda hoje, é o árbitro alemão com mais decisões em seu histórico.

A final entre Brasil e Itália garantia que o campeão ficaria com a posse definitiva da Taça Jules Rimet. Segundo o jornal O Globo, a Fifa ainda pretendia manter o nome ao próximo troféu. A informação foi dada por Mihajlo Andrejevic, presidente do Comitê Executivo. O secretário geral, Helmut Kaeser, afirmava ainda que a definição do novo troféu deveria ser o primeiro passo da organização da Copa de 1974. Também surgia a ideia de que os países ganhadores recebessem réplicas de prata da taça, o que não acontecia até então.



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