Novos registros de arma de fogo crescem 50% no primeiro trimestre de 2021

| JOVEM PAN / GIULLIA CHECHIA MAZZA


Maioria dos novos registros se enquadram na categoria 'cidadão comum', que contabiliza 35.807 permissões no primeiro trimestre de 2021

Durante o primeiro trimestre de 2021, o número de novos registros de armas de fogo no Brasil aumentou 50,2% na comparação com o mesmo período do ano anterior. Nos três primeiros meses deste ano, foram registradas 82.357 armas. Deste total, 19.105 ocorreram em janeiro, 19.612 em fevereiro e 43.640 em março. Já nos primeiros três meses de 2020, 54.828 armas foram registradas — 15.101 em janeiro, 14.608 em fevereiro e 25.119 em março. Os dados, obtidos com exclusividade pela Jovem Pan, foram divulgados pela Polícia Federal (PF). A maior parte dos novos registros autorizados pela PF se enquadram na categoria “cidadão comum”, que contabiliza 35.807 permissões no primeiro trimestre deste ano. Somando a quantidade de autorizações concedidas pelas autoridades a cidadãos comuns em 2020, o número atinge 21.243 permissões.

Para a juíza de direito do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), Ivana David, os decretos que ampliam e facilitam o acesso dos cidadãos às armas podem explicar o salto de 50% na quantidade de novos registros no primeiro trimestre deste ano. “Os decretos expedidos pelo presidente da República ampliaram e facilitaram muito o acesso dos brasileiros aos armamentos. Por exemplo, hoje as pessoas podem ter armas dentro de suas propriedades, estão autorizadas a adquirir uma quantidade maior de armamentos e munições e, para conseguirem o porte de armas, podem apresentar exames realizados por psicólogos particulares. Todos estes mecanismos, trazidos pelo presidente através de decretos, diminuíram as barreiras existentes e contribuíram para que a população ficasse mais armada”, explica. Apesar de corresponder à expectativa do eleitorado do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), para a juíza, os decretos presidenciais impulsionam uma “tremenda confusão” no meio jurídico. “Os atos causaram uma tremenda confusão no meio jurídico porque, uma hora é decidido que o cidadão pode andar armado, mas na hora seguinte, o decreto é revogado ou alterado.” Eleito defendendo a flexibilização do uso e da compra de armas, Bolsonaro já editou 31 atos que facilitam o acesso aos armamentos desde o início de seu mandato. Alguns deles foram revogados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e outros avançaram, mas todos causam polêmicas no debate público.

“A sociedade está lidando com uma nova política de governo. O presidente é armamentista e este é um dos pilares que o elegeu. Por isso, Bolsonaro está usando os decretos para responder ao eleitorado. No entanto, ao fazê-lo, ele passa por cima da Constituição e dos outros Poderes”, afirma a juíza. Decretos são atos do presidente da República que regulamentam leis. Desta forma, eles não precisam passar por votação e aprovação no Congresso. Cabe ao presidente regular as leis existentes através dos decretos, não criar novas leis. “O decreto é um dispositivo jurídico que o Executivo possui para, eventualmente, esclarecer dúvidas ou preencher lacunas vazias nas letras da lei. O decreto não serve para legislar. A elaboração de uma lei deve obedecer ao procedimento constitucional que prevê uma longa discussão do projeto de lei com a sociedade, debates e votações na Câmara e no Senado, além da sanção presidencial. Em vigor desde 2003, a lei que regulamenta as armas no Brasil é o Estatuto do Desarmamento. Se o presidente possui a vontade de flexibilizar o acesso às armas, deveria fazê-lo através do legislativo, que revogaria o Estatuto do Desarmamento e faria tramitar uma nova lei de acordo com o procedimento constitucional”, esclarece.

As próximas eleições presidenciais acontecem no próximo ano. Segundo a juíza, se outro político for escolhido para sentar-se à cadeira de chefe do Executivo, todos os decretos publicados por Bolsonaro podem ser derrubados. “Quem possui a responsabilidade de legislar são as Casas do legislativo. O Executivo não pode passar por cima dos demais Poderes usando decretos para elaborar leis. Até por isso, estes atos possuem prazo de validade e podem ser revogados a qualquer momento. Por exemplo, muitas vezes o STF revoga os decretos publicados pelo presidente porque a Corte possui a função de julgar a validade das leis para zelar pela Constituição. Além disso, se um novo presidente for eleito, pode derrubar todos os decretos quando quiser”, diz.



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